Quem trabalha, se envolve, se compromete ou se mobiliza nas ações de captação de doadores de sangue recebeu com entusiasmo as novas limitação de idade para a doação. Desde que com autorização de seus responsáveis civis, indivíduos com 16 e 17 anos já podem fazer sua doação. Ainda, indivíduos de até 67 anos também o podem fazê-lo, ampliando em mais dois anos esta ação.
Talvez esteja na contra-mão, mas confesso que me senti incomodada. Trabalhando de forma comprometida há 12 anos na captação de doadores, canalizando minhas ações além dos critérios que possibilitem a doação, mas na divulgação de informações científicas, técnicas, sobre a fisiologia do sangue, os determinantes de sua tipagem, suas compatibilidades e sua produção, me senti vencida diante da necessidade de se ampliar os limites de idade porque os anteriormente estabelecidos não trouxeram a mobilização necessária e não supriram a demanda.
Bom ter uma faixa ampliada de indivíduos aptos para a doação de sangue. Melhor se não fosse necessária tal ampliação. Melhor se cidadãos na faixa entre os 18 e 60, conscientes da necessidade de se disponibilizar ao gesto, sensíveis à importância de tal gesto, fossem suficientes para minimizar a angústia daqueles que dependem exclusivamente deste ato de responsabilidade social.
Muitos avanços já foram observados nesta árdua tarefa de buscar indivíduos que entendam a necessidade do gesto de doar. Geralmente iniciado em situações de grande apelo emocional, aquele que se torna um doador percebe sua importância e descobre uma experiência do bem. E a quer vivê-la novamente. Ouvindo relatos de doadores, percebe-se que têm um perfil de indivíduos que se importam, se envolvem com a dor do outro, outro este que lhes é desconhecido, mas que entendem que sua ação é absolutamente imprescindível. A segurança do processo, a qualificação do profissional, a responsabilidade dos hemocentros, hoje, tranquilizam o doador e fortalecem os voluntários, associações, fundações que trabalham nas campanhas de captação. Seja no ato de doar ou no trabalho de buscar doadores, aqueles que nisso se envolvem agregam, para as suas vidas, experiências do bem. Mas elas sabem o quão ainda têm que trabalhar para isso, o quão insuficiente ainda é o contingente de doadores para a demanda. E saber que foi necessário ampliar os limites de idade para suprir esta demanda, a mim, chegou com mais tristeza do que entusiasmo. Que pena que os limites anteriores não vêm trazendo aquilo de que se necessita, que pena que precisamos de indivíduos cada vez mais jovens e daqueles que já fizeram tanto pela causa. Sim, porque aquele que doar até os 67 é porque, provavelmente, já doou por muitos anos e têm solidificado em si seu papel solidário. Gostaría de deixá-lo, enfim, descansar, e lhe deixar saber da minha eterna gratidão pelo que já fez pela causa.
Nas palestras, encontros, mobilizações que faço para colaborar na construção desta cultura de solidariedade, tento mostrar a real necessidade e importância de um doador, esclarecendo que ainda não se produz sangue em laboratórios, que a verdadeira fábrica de sangue está no corpo de cada ser humano, e que dele depende a vida daquele que não o pode produzir. É preciso sensibilizar, é necessário emocionar mas, acima de tudo, é necessário esclarecer. Uma informação só se torna relevante quando se transforma em compreensão, em conhecimento. Quando a informação não é compreendida é apenas um dado em estado bruto. E provavelmente não fará diferença na vida de ninguém.
Queremos mais. Precisamos de muito mais. Que os novos doadores sejam bem-vindos. Que nossos jovens de 16 e 17 anos possam viver essa experiência do bem. Que nossos vividos senhores e senhoras de 66 e 67 anos continuem tendo essa experiência do bem. Mas, de verdade, eu preferiria sentar com eles e convidá-los a contemplar um grande número de voluntários nos limites antigos e dizer-lhes, aos primeiros, que em breve eles serão nossos doadores queridos e, aos demais, que foi muito bom tê-los conosco por tanto tempo. Que lhes seremos eternamente gratos. E queria muito dizer-lhes: o homem, finalmente, se construiu como um ser solidário.
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