quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

22 e 23 de janeiro de 2007

22/01/2007 Meu irmão está mal, com pus saindo pelos drenos. São muitas complicações. Parece que ele está preprando a partida dele, como se as pessoas precisassem esquecer a violência do acidente e pensassem somente no amor, na esperança, no que podemos fazer em vida. Sinto meu irmão distante e isto doí. Eu não queria que fosse assim. Eu queria mudar tudo.

23/01/2007 Talvez o caminho do Francisco, de agora em diante, não seja conosco. Sinto uma dor na região do abdômen. Minha psicóloga disse que esta dor é a dor do desprendimento. Preciso me desprender do meu irmão. Preciso aceitar e deixar ele seguir o caminho dele. Preciso aceitar que talvez este caminho não seja o meu, comigo.

Eu vou me refazer. Claro que vou, mas preciso de um tempo para rever meus valores. O quê quero para a minha vida depois de tudo isto. Se eu tenho que conviver com tudo isto, assim farei. Não vou fugir do que a vida me mostrar. Só preciso ficar quieta. Bem quieta. Sem se expôr, sem ver as pessoas. Apenas ficar quieta no meu cantinho.

Uma carta para meu irmão
Francisco, não quis aceitar o quê aconteceu desde a primeira vez que a nossa mãe falou sobre o acidente. Achei que se eu pensasse positivo eu poderia mudar tudo. Poderia devolver o teu olho,  a tua beleza, tudo que tinha sido machucado. Assim permaneci pensando. Fui te visitar na UTI sem medo e não enxerguei teus machucados, apenas senti a tua força. Saí enlouquecida, contando que estavas forte, abraçando todo mundo e dizendo que tu ía sair desta rapidinho. Briguei com a nossa mãe porque ela só pensava nas sequelas. Voltei para São Chico e quando soube que precisavámos repor as 40 bolsas de sangue, quase enlouqueci no computador buscando doadores de sangue. Tudo que fiz nestes dias foi pensando em ti. Na minha cabeça, se eu conseguisse realizar boas ações e mobilizar boas energias, eu estaria revertendo tudo isto para ti, em luz, em amor e cura. Tudo que fiz foi pensando em ti.

Nunca imaginei que as coisas chegariam onde chegaram, nem que alcançassem tantas pessoas. Não era minha intenção. Meu única desejo era te salvar. Fiquei impressionada com tanta gente ajudando e achei que assim a cura viria com certeza.

Mas na sexta-feira (19/01) entrei para te visitar e me senti triste. Pela primeira vez enxerguei os teus machucados. Percebi que não eram os meus esforços que te salvariam. Percebi que tu tinha o teu caminho e eu, o meu. E que eu precisava deixar de ser a irmã mais velha, super protetora, para ser uma amiga que iria sorrir sempre que nos encontrassemos. E é somente isto que posso ser na tua vida: uma amiga fiel, pronta para ajudar.

Voltei para São Chico e não consegui mais esconder a minha dor: a de que não estamos no mesmo caminho. Pensei em fugir, em esconder todas estas descobertas e deixar tudo ameno, mas não posso. Tu não iria concordar. Preciso aceitar que meu irmão tem suas escolhas e eu as minhas.

Tô tendo que passar por cima do egoísmo, do ciúmes, da possessão e da prepotência. Preciso ser mais humilde, mais resignada (como me disse o tio Noel) e mais tolerante para aceitar que nem todas as pessoas irão ficar ao meu lado, como eu quero. Eu vou fazer isto, Fran. Não quero sofrimento entre nós, mas luz e amor para continuarmos. Tu no teu caminho e eu no meu. E mesmo assim, juntos na vida. 

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